No dia 24 de julho, o jornal Valor Econômico publicou artigo do ex-conselheiro da Eletrobras, Vicente Falconi. Com o título “Capitalizar a Eletrobras”, o artigo faz menção, entre outros assuntos, sobre o desempenho econômico-financeiro da estatal, considerado por Falconi uma das justificativas para a privatização da empresa e contestado por José da Costa Carvalho, ex-presidente da Holding.

Veja a íntegra da resposta de José da Costa:

Faço menção ao artigo de autoria de Prof. Falcone, publicado na última semana, intitulado como “Capitalizar a Eletrobras”.

Não pretendo analisar a proposta de privatização defendida, mas fazer considerações sobre algumas informações e dados prestados relacionados a administração anterior, que são bastante diferentes do que realmente ocorreu.

Presidi, com muita honra, a Eletrobras de fevereiro de 2011 a julho de 2016, depois de atuar 33 anos na Cemig e 10 anos na iniciativa privada. Em 2011 a Eletrobras apresentou um lucro de R$ 3,7 bilhões e caminhava para um lucro bem superior a este valor em 2012.

Com a edição em 2012 da MP-579, sobre a renovação das concessões, a Eletrobras perdeu repentinamente R$ 8,75 bilhões de receita anual ́o que impactou fortemente seus indicadores econômico-financeiros. Internamente já estávamos trabalhando estrategicamente sobre o assunto, que deveria acontecer em 2015 e imaginávamos com uma perda de receita bem inferior.

Editada a MP, reforçamos nossa atuação em dois sentidos: o primeiro de aumentar a receita, pela reconsideração no cálculo dos preços de ativos de geração e principalmente de transmissão não amortizados, hoje plenamente reconhecidos no valor de R$ 46,0 bilhões.

E o segundo pelo aumento de outras receitas e redução dos custos, a partir de diretrizes consubstanciadas em um Plano Estratégico de Longo Prazo e em Planos Diretores de Negócio e Gestão-PDNG, com horizonte quinquenal e revisão anual.

Estas diretrizes geraram metas e ações operacionais e econômico-financeiras, desdobradas para as empresas subsidiárias , através dos Contratos de Metas e Desempenho Empresarial- CMDE e daí para os diversos órgãos das empresas, através dos indicadores para o Sistema de Gestão de Desempenho-SGD.

 Assim não é verdade a afirmação absurda, que a empresa não tivesse um fluxo de caixa ou indicadores.

Nem tão pouco que pagássemos juros escorchantes. Pelo contrário, mesmo durante a crise financeira fizemos uma captação de R$ 6.0 bilhões com juros de 118% do CDI, a época compatíveis com juros de mercado. Outra informação absurda é a de que não tínhamos relação com o mercado financeiro. A Eletrobras, como uma empresa de de capital aberto, listada na B3 , na Bolsa de Nova Iorque e na Bolsa de Madrid, sempre teve compromisso com o mercado. Assim participou de forma sistemática em teleconferências, eventos, apimecs, reuniões com analistas e investidores no Brasil e no exterior , dando ampla divulgação ao mercado, mesmo nos períodos adversos.

Uma das ações realizadas foi a implantação de programas de incentivo ao desligamento de empregados, que permitiu a redução harmoniosa do quadro de 4.000 empregados. Quando deixamos a presidência da Eletrobras o número de empregados era inferior a 23.000 e não de 26.000 como assinalado.

Outra diretriz aprovada foi a privatização das distribuidoras, iniciada com a Celg e depois com as outras seis distribuidoras do Norte e Nordeste. Estas ações, nem todas de responsabilidade da Eletrobras, não foram concluídas no período de nossa gestão, mas devidamente encaminhadas e atualmente concluídas, o que demonstra a assertividade nas estratégias que vinham sendo adotadas pela companhia. Se computássemos o efeito da privatização, o quadro se reduziria para cerca de 16.500 empregados ao final de nosso mandato.

Naturalmente que não cabe aqui descrever todas as ações tomadas, mas queremos ressaltar as providências iniciais para a implantação do sistema computacional de gestão empresarial PRO-ERP, abrangendo todas as empresas do grupo, a automação dos processos operacionais e a informatização dos processos administrativos.

O desempenho operacional de nossas empresas no Sistema Interligado Nacional, medidos pelos índices de defeito/Km ou de robustez, melhorou mesmo neste cenário de escassez de recursos, com resultados superiores ao conjunto dos outros agentes do setor. Também as distribuidoras registraram melhorias em sua performance operacional, medidos pelos indicadores de duração e frequência de interrupção por consumidor.

Tivemos que reduzir nossa participação em leilões, reavaliar prioridades, ajustar cronogramas, mas mesmo assim, ao contrário do propalado, a expansão foi significativa. A capacidade de geração foi acrescida de 6.000 MW, o sistema de transmissão de 9.000 km de linhas e ligamos cerca de 1,0 milhão de novos consumidores, o que contribuiu significativamente para se atingir a quase 100% de universalização de nossos serviços.

A maior parte da expansão em geração e transmissão foi feita em empreendimentos conjuntos com a iniciativa privada, nos quais a Eletrobras detinha cerca de 50%.

Desta forma o total da expansão em geração e transmissão disponibilizada para o Brasil é quase o dobro do valor acima apresentado. Além disto, só estamos computando nos números as instalações que entraram em operação, e não aquelas em fase final de conclusão Somente estes ativos, em sua fase pós financiamento, deverão gerar um fluxo de caixa líquido anual para a Eletrobras, superior a R$ 10,0 bilhões.

Como consequência da já mencionada redução de receita, acentuada pela perda em ações jurídicas sobre o empréstimo compulsório, ocorrido na década de 1960, tivemos acentuados prejuízos de 2012 a 2015, mas que foram revertidos no primeiro semestre de 2016, fruto das ações tomadas e principalmente com a reconsideração dos ativos não remunerados anteriormente. No primeiro semestre de 2016, tivemos um lucro recorde na história da Eletrobras de R$ 8,9 bilhões. Calculando-se o endividamento pela relação dívida líquida/ebtida com os dados do balanço do primeiro semestre de 2016, o indicador seria inferior a 1,0. Gerencialmente é normal se retirar o efeito não recorrente da receita empresarial, mas de qualquer forma este efeito está refletido nos balanços atuais. E mais, terá; reflexos adicionais ainda não lançados em balanço. O valor de mercado da Eletrobras em julho de 2016 foi substancialmente elevado para R$ 23,3 bilhões.

Não pretendemos demonstrar que a empresa operava com padrões ótimos.

Pelo contrário, tínhamos consciência do muito ainda a ser feito, conforme estabelecido na ultima revisão de nosso PDNG 2016-2020.

Tão pouco queremos tirar o mérito da atual administração.

Só queremos o reconhecimento dos resultados alcançados.

É uma questão de respeito profissional aos conselheiros, diretores, gerentes e empregados que tanto esforço deram a empresa neste período tão conturbado.

Atenciosamente.

José da Costa Carvalho Neto

 O CNE também questiona sobre qual benefício o consumidor teria em ter uma única grande empresa privada sob controle estrangeiro

O Sr. Vicente Falconi demonstrou em seu artigo, “Capitalizar a Eletrobras”, que a empresa conseguiu se recuperar de uma das maiores crises de sua história e hoje apresenta resultados robustos de uma estatal saudável, pouco endividada e lucrativa, pronta para investir. Mas no mesmo artigo o Sr. Falconi afirma que a Eletrobras precisa ser privatizada, argumentando que assim ela poderia investir mais. Há que se fazer algumas perguntas ao autor e ao público em geral. Quem garante que uma Eletrobras privada, controlada certamente pelo capital estrangeiro, vai preferir transformar seus lucros em investimentos em energia, sabidamente de longo prazo de retorno, a enviá-los a seus acionistas?

Se a iniciativa privada tem tanto interesse em investir no setor, porque não o faz? Qual a vedação que existe no marco legal brasileiro ao investimento privado no setor elétrico? Por que a iniciativa privada necessita comprar a Eletrobras para só aí realizar investimentos? Por fim. Admitindo que os proprietários da Eletrobras privada resolvam de fato investir no país e a empresa aumente sua fatia de participação no mercado.

Que benefício o consumidor teria em ter uma única grande empresa privada, sob controle estrangeiro, com mais de 1/3 da geração e quase a metade das linhas de transmissão do país? Será que um oligopólio privado é o melhor para nosso setor Elétrico?

Acesse aqui o boletim do CNE