No dia 11 de dezembro, seguindo seu périplo midiático para vender sua proposta de privatização da Eletrobras, o Sr. Wilson Pinto Junior, deu entrevista aos jornalistas Felipe Gutierrez, Igor Utsumi e Ivan Martinez-Vargas, do jornal Folha de São Paulo, que recebeu a seguinte chamada: “Privatização da Eletrobras junto de eleição não assusta investidor, diz presidente”. Abaixo, as perguntas formuladas pela Folha com as respostas do Sr. Wilson Pinto Junior devidamente comentadas:

“Folha – Quanto à privatização vai levantar? Wilson Ferreira Jr. – O valor vai depender das condições que vão colocar para as cotas. O que o governo colocou no Orçamento, e não é necessariamente só a descotização, foram R$ 12 bilhões. Aí pode ter a perspectiva de que outras usinas que vão vencer lá na frente, por exemplo, Tucuruí, possam também ser antecipadas, mas é mera especulação. Não posso saber disso. Vou ser quem, ao preço que eles derem, terá de calcular se ele será bom ou não para a companhia. Como o meu “equity” [ativo] é a descotização, eu vou pagar para ter um direito, e quem vai ceder esse direito é o governo, que não vota na assembleia. Se eu colocar R$ 200 [MWh], vou ter de vender acima disso. Duvido, deve colocar mais baixo…”

Comentário: A resposta do Sr. Wilson Pinto Junior comprova que ele enxerga os negócios da empresa como um mero comércio – ele a pensa com a cabeça de comerciante ou dono de padaria, focando tão somente na geração de receitas, impostos, lucros e dividendos e ponto final. Questões estratégicas, geopolíticas, segurança energética, modicidade tarifária e preocupações com os consumidores não orbitam em sua mente, que está obcecada na privatização da Companhia. Os números (R$ 12 bilhões, R$ 200 MWh, etc) não dizem muita coisa! O que realmente fala alto nesta questão é que teremos “energia velha e já amortizada”, sendo comercializada como nova fosse, ou seja, energia mais cara sendo jogada no mercado consumidor. Segundo informações divulgadas pelo MME, a Eletrobras possui cerca de 14.000 MW (amortizados e cotizados) que serão descotizados e grande parte dessa energia será comercializada no mercado livre.

Quanto custaria construir e colocar em operação hoje os cerca de 14.000 MW (quase uma Itaipu) destinados à descotização? Quanto 14.000 MW produzirá anualmente em MWh? Qual o tamanho da receita a ser ob da anualmente com essa produção? Quem afinal pagará a conta?

“Folha – Quanto? Wilson Ferreira Jr. – Não sei, R$ 150, R$ 140, mais baixo, que seja factível colocar no mercado livre, em condições de satisfazer o negócio e não aumentar a tarifa.”

Comentário: O negócio é tão bom, que para ele, qualquer número serve! Então ratificamos a pergunta: Qual o preço justo, para o consumidor, de 1MWh de energia amortizada? Qual o valor e peso desse mesmo 1MWh dentro da política tarifária nacional? Qual o valor desse 1MWh em épocas de escassez e sendo comercializado no mercado livre

“Folha – Qual será o ritmo da descotização de 14 das hidrelétricas? Wilson Ferreira Jr. – Haverá, provavelmente, um prazo para descotizar, já ouvi de três a cinco anos. Se tirar de uma hora para outra todas as cotas, não será bom para o mercado. Hoje há nas distribuidoras uma subcontratação. Então, fazendo a um ritmo ponderado, permitirá que elas se beneficiem porque vão reduzir a sua subcontratação [há uma compra de cotas obrigatória, para garantir que haja energia para atender ao mercado, com alguma reserva.”

Comentário: A cada fala o Sr. Pinto Junior deixa nítidas as artimanhas que estão por trás dos processos de descotização e de privatização da Eletrobras, vejamos: como a proposta representará aumentos significativos nas tarifas, eles pretendem parcelar a maldade para não chamar a atenção dos consumidores, mas o certo é que a conta virá e será salgada – isso não se tem dúvida! O mais interessante é a esperteza de fazer a descotização e destinar boa parte dessa energia para comercialização no mercado livre e de curto prazo. Aquela energia que, de certa forma, socorria o mercado regulado em momentos de crise hidrológica e de escassez, passará a ser vendida a peso de ouro! A aberração das aberrações! Os parlamentares, representantes do povo, devem ficar atentos às entrelinhas e ar manhas embutidas no PL que será enviado ao Congresso Nacional.

“Folha – Quando no segundo semestre vai ocorrer a operação? Wilson Ferreira Jr. – Emissão é feita não quando você quer, mas quando quer quem compra. Será feita numa janela dos investidores no segundo semestre, na volta das férias americanas. Entre setembro e dezembro…”

Comentário: Em agosto de 2017, o ministro Fernando Coelho Filho, seu secretário-executivo Paulo Pedrosa (aquele citado pelo The Guardian) e o Sr. Pinto Junior, reuniram a imprensa e anunciaram com pompa e circunstância que a Eletrobras teria o seu CAPITAL DEMOCRATIZADO, fugindo da palavra PRIVATIZAÇÃO – não queriam assustar a sociedade.

Agora, o Sr. Pinto Junior, informa que a famosa “democratização de capital” não é para brasileiro não, é para “gringo”. Será que o brasileiro só serve para pagar a conta desse processo maquiavélico, onde: os acionistas minoritários ganham muito; o governo se ilude e abre mão de suas prerrogativas e controle e os consumidores pagam mais. Outra razão para que a “democratização” seja focada nos “gringos”, decorre do fato de o Grupo 3G, de Jorge Paulo Lemann, e o Sr. Juca Abdalla, do Banco Clássico, já serem, atualmente, os maiores acionistas minoritários da Eletrobras – eles querem que a pulverização ocorra prioritariamente lá fora, para que eles possam, tranquilamente, controlar a “Corporação” aqui dentro. Nessa brincadeira, a Eletrobras, deixará de ser uma estatal e passará a ser um “oligopólio” dominado por aqueles que fazem parte do seleto grupo dos 6 brasileiros, isso mesmo 6, que detêm a mesma riqueza que 100 milhões de brasileiros – distorções do capitalismo selvagem, que nascem a par r de processos como esse da Eletrobras e do Setor Elétrico, não é a toa que essa jogada vem sendo chamada com “O negócio do Século”.”

Folha – Época de eleição não preocupa o investidor externo? Wilson Ferreira Jr. – Nem o estrangeiro e nem o brasileiro. Se tem uma oportunidade de um negócio em uma companhia, não tem nada a ver com eleição.”

Comentário: Sr. Pinto Junior, suas colocações cabem perfeitamente para uma companhia privada, não estatal, que não atue com serviços públicos e não possua capilaridade nacional. Neste caso, pode ser que os debates eleitorais, realmente não venham influenciar em nada as oportunidades de negócio. Agora, no caso da Eletrobras, é diferente, pois estamos falando da maior empresa de energia elétrica da América Latina, concessionária de serviços públicos, empresa estatal, que possui capilaridade nacional, que detêm significativa parte da geração, transformação e transmissão de energia e, mesmo com todas as dificuldades e problemas regulatórios, cumpre sua missão perante a sociedade e apresenta resultados positivos. É ledo engano, querer tratar a Eletrobras como uma empresa privada qualquer, onde os interesses dos dirigentes e acionistas são superiores aos interesses da sociedade. Um exemplo a ser verificado é a situação da CPFL, que era privada e foi vendida para os chineses – hoje uma estatal chinesa operando dentro do Brasil. Contradição: Estatal brasileira explorando serviços públicos de energia não pode, estatal chinesa pode!

“Folha – Mas podem querer alegar insegurança para baixar preço? Wilson Ferreira Jr. – O negócio de infra-estrutura é de 30 anos. Não tenho dúvida de que haverá interesse porque são as últimas [usinas]. Depois delas, o mapa fica quase completo.”

Comentário: Neste ponto, concordamos integralmente com o Sr. Pinto Junior, trata-se de filet mignon, um “negócio da china” – usinas amortizadas, produzindo energia velha, que será vendida a preços de nova e com sinal verde para comercializações no mercado livre de curto, médio e longo prazo. Realmente o mapa está quase completo, razão dos atropelos para viabilizar o negócio a qualquer custo! O que mais assusta nesse processo todo é a pressão, a pressa e a sangria desatada para que os projetos sejam aprovados de qualquer jeito, sem muitas discussões e questionamentos por parte dos parlamentares – algo jamais visto na história do país! Só que os Deputados Federais, Senadores e Governadores estão atentos a tudo, compreendem os reais objetivos das propostas e questionarão cada ponto dos projetos de lei, buscando o melhor para o país e para os consumidores.

“Folha – Se houver um candidato considerado extremista pelo mercado na liderança, poderá prejudicar a transação? Wilson Ferreira Jr. – Você me responda: e se não fizer? Você vende usina a usina. Se vender uma a uma, o que ocorre com a Eletrobras? Perde 14 usinas, quase 1/4 da nossa capacidade e fica com todos os custos e os problemas, os financiamentos, as discussões judiciais… [A Eletrobras] aguenta? Duvido.”

Comentário: “O poder quando exercido com arrogância e prepotência, turva a visão e afugenta a inteligência.” (Autor Desconhecido). Neste contexto, a recuperação e fortalecimento da Eletrobras passa por uma análise criteriosa de seus problemas (fraquezas, deficiências, ofensores externos, impactos regulatórios e as possíveis ações mitigadoras), valorização de suas potencialidades e busca de alternativas que contemplem os interesses de todas as partes interessadas, com destaque para os voltados para os consumidores.

Não é novidade para ninguém, que o setor elétrico brasileiro está com sérios problemas regulatórios, desequilíbrio econômico financeiro e um modelo setorial que necessita de reformulação. E não é com operações casadas (descotização BR e “democratização USA”) que esses problemas deixarão de existir! Como bem disse o Sr. Pinto Junior, a Eletrobras já está caminhando rapidamente para atingir baixo índice de endividamento (4,1 vezes, com viés de baixa). Imaginem se somarmos a esse baixo nível de endividamento todas as potencialidades da Companhia (capilaridade nacional, capacidade técnica reconhecida e domínio de praticamente todas as fontes da matriz energética). Feito isso, a Eletrobras poderá continuar liderando o setor, sem a necessidade de vender a vos e nem se submeter a uma desconfiguração em troca de alguns reais do capital privado. Os horizontes da Eletrobras são magníficos, faltando-lhe apenas uma gestão séria e comprometida com os interesses e futuro da Companhia.

Boletim CNE