Por José Daldegan Júnior*

 

A história nem sempre segue em frente. Eventualmente retrocede. Quando não se guarda a memória do passado, repetem-se antigas escolhas, e um ciclo se repete.

Em nossa história política, tivemos vários ciclos alternados entre um perfil de economia submissa, periférica e um perfil nacionalista, desenvolvimentista, em busca de auto-suficiência. Também tivemos vários golpes de estado, com reiterados pretextos e objetivos.

A própria Proclamação da República foi um golpe à desgastada monarquia, para evitar maiores mudanças e assegurar o poder à elite extrativista. A mudança para um perfil desenvolvimentista veio com o golpe de Getúlio Vargas (1930) que, aproveitando-se de uma falsa ameaça comunista, obteve apoio das forças armadas e da classe média.

Com sua política trabalhista e desenvolvimentista, o “pai dos pobres” governou até ser deposto em 1945, quando, no fim da II Guerra Mundial, esgotou-se sua estratégia de neutralidade para obter investimentos dos EUA (que passaram a interferir mais diretamente na política brasileira).

Getúlio retornou logo, em 1951, eleito pela novidade do voto direto e com força para fazer seu sucessor. Entretanto, sob acusações de corrupção, sofreu um cerco em 1954 para empossar seu vice, que era da oposição (a eleição não era casada). Com seu suicídio, Vargas desmoralizou o golpe e garantiu a vitória, em 1955, de JK, seu sucessor.

Em 1960, a oposição, novamente com a bandeira de “varrer a corrupção”, elegeu Jânio Quadros que, com um frustrado simulacro de renúncia para comover as massas, mobilizar as forças armadas e dobrar o Congresso, abriu espaço para João Goulart (seu vice, varguista), que em 1961 retomou a linha trabalhista e desenvolvimentista.

Em 1964 foi a vez de a oposição usar a sombra do comunismo, que a mídia projetava nas reformas populares de Jango, para obter o apoio das forças armadas e da classe média para outro golpe. Entretanto, a cúpula militar não devolveu o poder aos civis. Nacionalista que era, buscou o crescimento econômico, mas com concentração de renda, e só restabeleceu a democracia em 1985, quando a economia brasileira sucumbia com taxas elevadas de inflação e o comunismo no mundo regredia.

Após uma transição à plena democracia, selada com a Constituição Cidadã de 1988, a linha de economia periférica, de roupagem neoliberal, retornou com força ao poder em 1990, com a eleição direta de Collor, tendo um breve hiato no governo de seu vice, Itamar, mas se consolidando com FHC, que instituiu a reeleição e obteve um segundo mandato.

A linha desenvolvimentista e trabalhista retornou em 2003, com a eleição de Lula, que conseguiu em dois mandatos conciliar o desenvolvimento com a distribuição de renda. Dilma continuou com a linha de distribuição de renda, mas não conseguiu manter o ritmo de crescimento e conter a inflação, tendo que adotar medidas restritivas de ajuste fiscal no início do segundo mandato.

Enfrentamos mais uma crise econômica, política e moral. Embora as investigações e julgamentos de casos de corrupção nunca tenham sido tão exemplares, a mídia nunca lançou tanta suspeita e expôs tanto desrespeito a um mandatário. Não há como evitar comparações com as crises dos governos de Getúlio, Juscelino e Jango.

 

E agora? O que queremos? Seguir em frente, acertando a dose do desenvolvimento com distribuição de renda, fortalecendo as instituições, prosseguindo com as investigações e punindo os culpados, ou ceder à sanha dos poderosos, retroceder à linha de uma economia periférica, submissa ao capital especulativo e, num misto de farsa e tragédia, repetir a história?

 

*José Daldegan Júnior é diretor do STIU-DF