Corrida e filas na época da campanha de imunização contrastam com o excesso de doses nos postos de saúde até hoje: mais de 8 milhões no total. População não sabe que pode tomar, se quiser, mesmo que não esteja nos grupos prioritários

Mais de oito milhões de vacinas contra o vírus H1N1 ainda estão disponíveis nos postos de saúde do país. A sobra corresponde ao gasto de R$ 92 milhões — 4,3% do investimento total do governo contra a pandemia. Na campanha de vacinação que teve início em março deste ano, cerca de 88 milhões de pessoas foram imunizadas. A meta do Ministério da Saúde foi vacinar ao menos 80% do grupo de risco — gestantes, portadores de doenças crônicas, crianças com mais de 6 meses e menos de 2 anos de idade, e também trabalhadores de saúde e população indígenas.

Diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia, Marcos Antonio Cyrillo, considerou alta a quantidade de vacinas que ainda restam nos postos de saúde: “Essas doses devem ser aproveitadas logo, já que o vírus da influenza sofre variações e no próximo inverno essa vacina pode não ter mais efeito”. Já o pneumologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília Ricardo Martins considera normal a sobra de vacina, em função da adesão em alguns grupos não ter chegado a 100%. A sugestão do médico é a de que o governo aproveite os lotes restantes para imunizar as populações que não receberam as doses ou iniciar uma nova campanha na Região Norte.

O Brasil gastou R$ 2,1bilhões no combate ao vírus responsável pela gripe A. Mais da metade desse montante (1,3 bilhão) foi destinado à compra de 113 milhões de doses da vacina.

De acordo com o diretor de vigilância epidemiológica do Ministério da Saúde, Eduardo Lage, o Brasil seguiu as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). “O principal desafio foi organizar uma campanha de vacinação bastante complexa.”

Aproveitar a viagem

De acordo com o Ministério da Saúde, as vacinas que sobraram não foram recolhidas dos postos de saúde e estão disponíveis para aqueles que não se vacinaram na época da campanha mesmo que não se enquadrem nos grupos de risco. Mas essa informação não é divulgada. Wherli Moura, 17 anos, estava em consulta no Posto de Saúde nº 6, no Distrito Federal, em companhia da mãe quando foi informado pelo Correio que naquela unidade restavam vacinas disponíveis. “Minha mãe já tinha tomado a vacina porque tem problemas respiratórios, mas eu não sabia que podia tomar agora”, conta. Aconselhado pela mãe, o estudante aproveitou a oportunidade e tomou a vacina, sem enfrentar nenhuma fila. Só nesse posto, localizado na 605 sul, estão disponíveis mais de 300 doses.

Em 2009, foram registrados 46,1 mil casos graves da doença e 2.051 mortes. Enquanto este ano, até 31 de julho, 753 pessoas com gripe A precisaram de internação e 95 morreram. De acordo com a OMS, o vírus continua em circulação no mundo, mas em conjunto com outros vírus sazonais, como a gripe comum. Diferentemente do que ainda ocorre em países como Índia e Nova Zelândia, o Brasil está fora do estado de epidemia. Mas a OMS alerta que o monitoramento e as ações preventivas contra a disseminação do vírus devem continuar, especialmente no cuidado com as gestantes, os portadores de doenças crônicas e os menores de dois anos, grupos dos mais vulneráveis à doença. Cyrillo acredita que a cobertura da campanha de vacinação foi eficiente, mas critica a infraestrutura do sistema de saúde e a falta de pessoal no atendimento à população. “Tinha gente que esperava quatro horas para ser atendida”, conta. Mas diz que o desafio maior está na educação do povo. “É necessário que a população tenha bons hábitos de higiene”, diz. (CK e RM)

» Memória
Depois da mutação

Em abril de 2009, a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou o mundo sobre o surgimento da Influenza A (H1N1). Chamado na época de gripe suína, o vírus, que antes só era transmitido entre os porcos, sofreu mutação com outros três tipos de gripe (duas humanas e uma aviária) e passou a infectar os seres humanos.

Desde a época em que foi descoberta, a gripe A matou mais de 18 mil pessoas em 214 países. A OMS temia que esse número pudesse chegar a 7 milhões. Este mês foi declarado o fim da pandemia e apenas alguns países, como a Índia, ainda estão em situação de epidemia.

(Fonte: Carolina Kodr e Renata Mariz)