Mesmo sem ter sido apreciado por todas as comissões da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), o PL 2260/21, que propõe a privatização da Rodoviária do Plano Piloto foi votado e aprovado, em Plenário, em dois turnos pela maioria dos deputados distritais. A sessão que aprovou o projeto de privatização proposto pelo governador Ibaneis Rocha (MDB) começou às 15 horas desta terça-feira (12) e se estendeu até a madrugada desta quarta-feira (13), com intensa mobilização dos deputados progressistas para tentar barrar o projeto.

A privatização da Rodoviária foi aprovada no 1º turno com votos de 15 deputados: Daniel Donizet (MDB), Eduardo Pedrosa (União), Hermeto (MDB), Iolando (MDB), Jaqueline Silva (MDB), João Cardoso (Avante), Joaquim Roriz Neto (PL), Jorge Vianna (PSD), Martins Machado (Republicanos), Daniel de Castro (PP), Robério Negreiros (PSD), Rogério Cruz (sem partido), Roosevelt (PL), Thiago Manzoni (PL) e Wellington Luiz (MDB). No 2º turno foram 16 votos pela aprovação, com a presença da deputada Doutora Jane (MDB) que esteve ausente na primeira votação.

Por outro lado, os seis deputados distritais progressistas foram contra: Chico Vigilante (PT), Dayse Amarílio (PSB), Fábio Félix (PSOL), Gabriel Magno (PT), Max Maciel (PSOL) e Ricardo Vale (PT). A deputada Paula Belmonte (Cidadania), que se declara independente na CLDF, se juntou aos deputados de oposição no voto contrário à privatização da Rodoviária do Plano Piloto. O deputado Pepa (PP), que está recém operado, chegou a ir na sessão, mas se ausentou antes das votações.

Desde o início da sessão o clima era de apreensão na CLDF, com segurança reforçada nas portas do prédio e uma triagem minuciosa para quem ia ocupar as galerias. Ainda assim, o espaço recebeu dezenas de ambulantes e permissionários que trabalham na Rodoviária do Plano Piloto e de militantes de movimentos sociais que participaram de toda a sessão e entoaram palavras de ordem contrários a privatização.

“O centro de Brasília é muito importante para que o caráter democrático dos espaços públicos da cidade seja garantido e que Brasília seja de todos e todas e não apenas de quem tem grana para pagar e se locomover”, afirmou Rafael Reis, coordenador do Instituto Cultural e Social No Setor, que acompanhou a tramitação do PL 2260/21 da galeria. Também estiveram presentes integrantes do Movimento Centro Pra Quem, do Movimento Estudantil e de sindicatos.

Ao final da votação o líder do governo, Robério Negreiros, tentou justificar: “O governo não está privatizando a Rodoviária. É um projeto para permitir uma parceria público-privada para a gestão ser privatizada, mas a rodoviária vai continuar sendo uma área pública”.

O processo de privatização da Rodoviária é cercado de interrogações, que ficou evidente até mesmo entre a base governista. Apesar de aprovarem o PL 2260/21, alguns parlamentares manifestaram dúvidas e contaram com o apoio do secretário de Transporte e Mobilidade do DF, Flávio Murilo Prates, que participou da sessão para convencer os parlamentares sobre o projeto de privatização.

Movimentações 

Parlamentares de oposição ao governo Ibaneis tentaram diversas movimentações ao longo do dia para impedir a votação, mas em vão. O PL 2260/21 já havia sido aprovado em três comissões. Fábio Félix chegou a acionar a Justiça alegando violação do processo legislativo, que foi negado pelo Tribunal de Justiça.

A deputada Dayse Amarīlio, que é presidente da Comissão de Assuntos Sociais, e o deputado Gabriel Magno, presidente da Comissão de Educação, Saúde e Cultura (CESC) solicitaram a tramitação do PL 2260/21 em suas respectivas comissões. O presidente da CLDF, Wellington Luiz, colocou ambas solicitações em votações e os deputados aliados de Ibaneis impediram a tramitação.

O PL 2260/21 ainda passou pela Comissão de Transporte e Mobilidade Urbana (CTMU), que é presidida por Max Maciel, e tem maioria de deputados de oposição a Ibaneis. O deputado Fábio Félix foi o relator do projeto na Comissão e fez um voto longo e contrário à privatização da Rodoviária, que foi lido em plenário e reprovado pela base de Ibaneis.

“A pretensão de se autorizar a concessão da Rodoviária, a nosso ver, simboliza a desistência do Poder Público de garantir, por seus próprios recursos, a Rodoviária do Plano Piloto como equipamento em prol do transporte coletivo público, acessível e de qualidade, e de seu espaço físico como democrático e livre”, afirmou Félix na conclusão de seu voto. E acrescentou, que “o certo é que o serviço de transporte estará mais onerado, e o espaço da Rodoviária menos acessível às pessoas mais necessitadas. Por esses motivos, somos pela REJEIÇÃO, no mérito, do  Projeto de Lei nº 2.260, de 2021, no âmbito desta CTMU”.

Deputados da oposição tentaram atrasar votação / Reprodução TV/CLDF

Críticas à privatização

Um dos pontos mais questionados pelos deputados de oposição ao governador Ibaneis foi em relação à falta de informações do projeto do Executivo em relação à taxa de acostagem dos ônibus. “Para justificar que é viável, o governo disse que vai assumir a taxa de acostagem, que é de R$ 11 milhões. Aí é fácil para uma empresa assumir, porque o pagamento da taxa de acostagem por 10 anos paga o investimento previsto de R$ 120 milhões, ou seja, o empresário não vai precisar tirar nada do bolso dele”, argumentou Max Maciel.

Já o deputado Gabriel Magno (PT) criticou o governador Ibaneis pelo projeto de privatização da rodoviária e lembrou que isso pode custar o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, que Brasília conquistou em 1987, mediante a um decreto de preservação. “Nós estamos diante de um ataque à legislação da lei orgânica e um decreto que não pode ser mudado, pois é a condição necessária para Brasília ter se tornado patrimônio cultural da humanidade.

O Ibaneis vai entrar para história como o governador que pode fazer o Brasil perder o seu principal título, o de Patrimônio Cultural da Humanidade, por rasgar a legislação que preserva o tombamento”, defendeu Magno.

A deputada Dayse Amarílio criticou a falta de abertura do governo e sua base na CLDF para ouvir as propostas. “Existe outra forma de fazer e a gente queria debater, porque são 20 anos [de concessão da Rodoviária do Plano Piloto]. Nós vamos terminar o nosso mandato, Ibaneis vai sair e vai continuar. A gente tem proposta para ter tarifa zero com a rodoviária arrumada, com esse valor que vai ser investido e não fomos nem sequer ouvidos”, reclamou.

O deputado Chico Vigilante (PT) chamou atenção para a perspectiva de aumento dos preços praticados na Rodoviária do Plano Piloto com a privatização. “Tem um grupo de  pessoas, que são as mais necessitadas, que anda de ônibus e não vai conseguir fazer um lanche na rodoviária. Os camelôs vão ser expulsos e como vão ganhar a vida? E os permissionários não vão conseguir pagar os aluguéis”, analisou Vigilante em seu discurso.

Por Valmir Araújo l Brasil de Fato DF – publicado em