Além de não poder contar com o desconto de 7,5% no pagamento à vista, cerca de 280 mil proprietários de imóveis no Distrito Federal podem ser alvo de reajustes indevidos na cobrança do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbano (IPTU) de 2011. Nos boletos que chegaram este mês, o aumento varia de 5% a 3.400%, o que assustou muitos brasilienses.

Os valores incentivaram o Ministério Público do DF a ajuizar, esta semana, uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) questionando três dispositivos da legislação que regula o assunto: o artigo 3º da Lei Distrital nº 4.452, de 2009, o artigo 3º da Lei Distrital nº 4.289 e o artigo 2º da Lei Distrital nº 4.072, de 2007.

Foram essas normas que autorizaram a Secretaria de Fazenda a modificar a pauta de valores do IPTU para incluir itens e alterar valores de cobrança com base nos preços de mercado. De acordo com o assessor de Controle de Constitucionalidade da Procuradoria-Geral de Justiça do DF, Antônio Suxberger, os dispositivos são ilegais. “Essas alterações só podem ser autorizadas por lei tributária específica e não por atos administrativos do Executivo”, explica. No entendimento do assessor, os artigos questionados violam a Lei Orgânica do Distrito Federal , uma vez que garantem ao Poder Executivo o direito de decidir sobre a forma de cobrança dos tributos, quando, na verdade, essa competência é do Legislativo. A ação ainda será julgada pelo Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT).

O problema foi criado quando o ex-governador Rogério Rosso (PMDB) não sancionou o projeto do IPTU aprovado pela Câmara Legislativa. Para obedecer ao que prevê a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o governo utilizou a mesma base de cálculos de 2010. Com isso, a cobrança deste ano, no entendimento do Ministério Público, deveria seguir a alíquota igual, incluindo descontos e o limitador aprovado à época, conforme prevê a Lei Distrital nº 4.452/09, o que não aconteceu. Embora a base de cálculo seja a mesma, não há instrumentos de contenção dos preços existentes, bem como desconto de 7,5% para pagamento à vista, como ocorria nos anos anteriores. Pela planilha de 2009, o governo só poderia reajustar o imposto em caso de aumento da área do imóvel ou da destinação.
A Secretaria de Fazenda alega ainda não ter sido notificada oficialmente sobre a Adin, mas voltou a dizer que alguns fatores alheios à vontade do GDF podem ter gerado reajustes acima da média em 2011. O fato de a Câmara Legislativa não ter estipulado um teto restringindo o reajuste máximo do IPTU à inflação do período anterior pode ser sido uma das causas dessa variação. Conforme técnicos do governo, de 2005 a 2010, existia um limitador inflacionário que não foi aprovado para este ano. Para eles, não há irregularidade na cobrança do IPTU, uma vez que a tabela foi seguida, conforme determina a lei. Além disso, o aumento seria justificado em virtude de o tributo ter ficado congelado nos anos anteriores.

Contribuinte
Para a economista aposentada Glorinha Ruas de Miranda, 64 anos, a atualização da tabela não poderia ter sido feita de uma só vez. “Os imóveis no DF valorizaram muito, e a renda das pessoas não está acompanhando. O valor de mercado do meu apartamento na Asa Sul está em uns R$ 800 mil, e a alíquota do IPTU é calculada sobre R$ 325 mil. Quando comprei, paguei R$ 200 mil. O IPTU deste ano ficou em R$ 1.253”, conta.

Assim como Glorinha, outros contribuintes perceberam mudanças na cobrança. “Este ano, eu realmente senti uma modificação, mas sempre pago porque não tem efeito reclamar sozinha”, acredita a aposentada Maria Terezinha de Oliveira, 78 anos. Na tarde de ontem, ela esteve no posto da Secretaria de Fazenda da 513 Norte para questionar o valor a ser pago: quatro parcelas de R$ 416. A primeira delas, aliás, será quitada com multa de R$ 20,80, em virtude do atraso de um dia. “Este ano, além de estar mais caro, o boleto não chegou a minha casa. Não é culpa do contribuinte se o documento não chegou. É um absurdo ter de pagar por um erro deles.”

Hoje, a deputada distrital Eliana Pedrosa irá ao Tribunal de Contas para tratar da cobrança do IPTU. Na última quarta-feira, a parlamentar protocolou ação no órgão para que o tribunal avalie a questão.

“As pessoas estão tão acostumadas com a alta carga tributária do nosso país que nem percebem os aumentos. Ninguém lembra quanto pagou no ano passado.” Caso o TJDFT identifique alguma irregularidade na cobrança do IPTU e reconheça a inconstitucionalidade, o GDF poderá ter de compensar os contribuintes pelos valores pagos indevidamente.

Colaborou Diego Amorim

Cálculo
O IPTU é recolhido anualmente pelos proprietários de imóveis urbanos. A alíquota e a metodologia de cálculo variam de um município para outro, mas a conta é feita com base no valor venal, ou seja, quanto maior o preço de mercado, mais caro é o tributo. No DF, desde 2004, o imposto é reajustado pelo índice da inflação.

IPVA polêmico
Em janeiro deste ano, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios recomendou ao secretário de Fazenda, Valdir Moysés Simão, auditoria nas tabelas Fipe e Molicar, usadas pelo GDF para definir os valores do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA).

Uma análise preliminar constatou preços maiores em 57% dos casos, o equivalente a 741 mil veículos. A depreciação teria sido observada somente em 43% dos veículos. Para que o valor do tributo não subisse, o governo definiu como teto a taxa paga em 2010, mas a cobrança gerou críticas por parte dos contribuintes e de especialistas. Em fevereiro, o governo concluiu auditoria e decidiu manter o mesmo valor anunciado anteriormente. Para justificar o reajuste, o Executivo alegou ter somado os valores ao longo dos anos e percebido um aumento nos preços de um ano para outro, decorrente da ampliação da frota.

(Mara Puljiz e Mariana Branco, Correio Braziliense)