Numa coletiva de imprensa convocada às pressas, no domingo (28), o ministro de Relações Exteriores do Paraguai, Luis Castiglioni, anunciou que o governo pediu ao Brasil a anulação da ata do acordo de compra de energia de Itaipu pela Ande, a estatal de eletricidade paraguaia.

Pelo acordo, a Ande iria tornar mais realista o volume de energia previsto para consumo no país, e não pedir até apenas a metade do que utilizaria, para depois completar com a energia adicional, aquela que Itaipu gera acima do previsto em contratos (acima de cerca de 70 milhões de megawatts-hora), que tem preço mais baixo.

Por causa dessa recusa da Ande de tornar mais realistas suas compras de energia, a Eletrobras, que fecha com Itaipu o contrato do que realmente precisa, se sentiu prejudicada e deixou de pagar à binacional, que estava (e volta a estar) sem faturar e, portanto, no limite de seus recursos para honrar compromissos, como o pagamento de royalties ao Brasil e ao Paraguai.

A assinatura do acordo, referendada pelo presidente Mario Abdo Benítez, provocou uma crise política grave. O presidente corria o risco de até mesmo sofrer um impeachment, devido à pressão oposicionista e de alas de seu próprio partido.

Houve protestos em todo o país, o que foi qualificado como “manipulação política” da oposição pelo chanceler paraguaio. Funcionários da Ande de algumas localidades entraram em greve.

Castiglioni informou no domingo (28) que, depois do cancelamento do acordo, o assunto voltará a ser tratado pelo Comitê de Administração de Operações, integrado por representantes das áreas técnicas da Ande, Eletrobras e Itaipu Binacional.

A polêmica no Paraguai veio de dois fatos importantes: o primeiro é que o acordo foi assinado em 24 de maio, mas não era de conhecimento público; o segundo, a demissão do presidente da Ande, Pedro Ferreira, que discordava dos termos do acordo.

Viagem cancelada

O presidente Mario Abdo Benítez chegou a adiar a viagem que faria no sábado, 27, à Turquia, para acompanhar a sessão extraordinária do Senado, nesta segunda (29), que vai analisar o acordo de compra de energia da Itaipu pela Ande.

No domingo, o ministro de Relações Exteriores do Paraguai, Luis Castiglioni, teve que voltar às pressas do Líbano, a pedido do presidente, já que terá que se apresentar nesta segunda ao Congresso.

O chanceler, mal chegou ao Paraguai, já dava entrevista coletiva informando do pedido ao Brasil de cancelamento da ata com o acordo.

A Câmara de Deputados do Paraguai também convocou uma sessão extraordinária para analisar a ata de contratação de potência de Itaipu e criar uma Comissão Bicameral de Investigaçã.

Ano difícil

Tanto o Brasil como o Paraguai fixam, em todo começo de ano, a contratação de potência (energia que vão usar) de Itaipu, mas este ano isso não foi feito, devido à questões técnicas levantadas pela Eletrobras, segundo a qual a Ande fixava valores energéticos bem abaixo do que consumiria de fato, para depois se suprir com a energia adicional de Itaipu.

Já no âmbito diplomático, o Brasil pediu ao Paraguai que cumprisse o Tratado de Itaipu e estabelecesse um cronograma de compra adequado a seu consumo.

Foi por isto que os dois países assinaram um novo acordo de compra e venda da energia de Itaipu, em maio, mas, no lado paraguaio, o presidente foi acusado de ser  “entreguista” tanto pela oposição como pela imprensa (os três principais jornais do país, ABC Color, Última Hora e La Nación, criticam ferozmente o acordo).

Para o chanceler Luis Castiglioni, a culpada sobre essa situação é a falta de boa comunicação do próprio governo. E, também, a reação dos meios de imprensa e da classe política.

2023

O presidente paraguaio justificou o acordo, na sexta-feira, afirmando que o país precisa deixar de aceitar migalhas e pensar em 2023, quando vai discutir com o Brasil o Anexo C do Tratado de Itaipu, que trata justamente da venda dos serviços de eletricidade da usina binacional.

“O que fizemos como governo, de olho em 2023, em relação à negociação de Itaipu, foi dizer ao Brasil: aqui há um Paraguai sério, que não necessita das migalhas de ninguém, que nós somos sérios e cumprimos nosso compromisso e vamos fazer respeitar nosso direito” disse o presidente paraguaio.

Atualização

“Manifestantes pedem renúncia dos que fizeram o acordo. Foto Walter Franco, Última Hora”.

Nesta segunda, 29, funcionários da Ande fazem manifestação na frente da sede da estatal, em Assunção. Eles exigem que o governo destitua o novo presidente da Ande, Alcides Jiménez; o diretor técnico de Itaipu, José María Sánchez Tilleria, o ministro de Relações Exteriores, Luis Castiglioni; e o embaixador paraguaio no Brasil, Hugo Saguier.

Segundo os manifestantes, o protesto acabaria ainda hoje pela manhã. Seria apenas para demonstrar o descontentamento dos funcionários da Ande com o governo.

Fonte: H2Foz