Fumo e sedentarismo sempre foram listados como grandes vilões da pouca longevidade. Mas uma pesquisa da Universidade de São Paulo (USP) revelou que a subnutrição é o principal fator de risco de morte em idosos. A nutricionista Luciana Ferreira (Ph.D), professora da Universidade de Taubaté, analisou mais de mil habitantes da região metropolitana de São Paulo com idade superior a 60 anos. A pesquisadora verificou a associação entre subnutrição e o óbito dessas pessoas e constatou que o quadro de subnutrição aumentou em 500% as chances delas morrerem. Significa dizer que idosos subnutridos têm seis vezes mais possibilidade de morrer do que aqueles bem alimentados.
lanches
A pesquisa foi baseada no Estudo Sabe: saúde, bem-estar e envelhecimento, realizado em 2000 e em 2006. Foram avaliados 1.170 idosos — homens e mulheres com mais de 60 anos, residentes em domicílio particular da área urbana do município de São Paulo. Subnutrição, sexo, renda, força muscular, fratura de quadril, hábito de fumar, câncer, depressão, diabetes, hipertensão, doenças coronarianas, pulmonares crônicas e vasculares cerebrais e óbito foram as variáveis analisadas na pesquisa.

O quadro de subnutrição foi comprovado utilizando-se o modelo de MiniAvaliação Nutricional(R). E os 332 óbitos foram averiguados pelo Sistema de Informações sobre Mortalidade de São Paulo. A conclusão foi que a subnutrição representa o fator de risco mais fortemente associado ao óbito em idosos brasileiros domiciliados, ou seja, que não estão em asilos ou casas de assistência coletiva. A subnutrição chega a superar o tabagismo, mesmo sabendo-se que o risco de óbito de fumantes é 140% maior do que para os que não fumam.
Sem energia
Renato Maia, responsável pelo Centro de Medicina do Idoso da Universidade de Brasília (UnB), afirma que a subnutrição associada a doenças e atratamentos inadequados tem grande impacto na saúde do idoso, gerando desequilíbrio na obtenção de energia para manutenção da vida. O especialista explica como esse processo gera uma corrente de risco: “Esgotadas as reservas de carboidratos — principal fonte de energia imediata — é utilizada a reserva de gordura. Em seguida vem o consumo de proteínas, o que gera perda muscular, alteração na produção de hormônios, enzimas e estruturas celulares. Assim, o funcionamento dos mecanismos de defesa, desintoxicação, cicatrização e regeneração dos tecidos fica afetado, o que facilita a ação de agentes infecciosos, acidentes vasculares e a descompensação (1) de órgãos vitais”, observa.
Maia destaca ainda que a perda de massa e força muscular interfere na locomoção e no equilíbrio, o que aumenta a vulnerabilidade dos pacientes a quedas e consequentes fraturas. “Alguns dos fatores que prejudicam a alimentação dos idosos são os males comuns do processo do envelhecimento. Idosos que têm prótese dentária mal ajustada ou sofrem de disfagia, por exemplo, têm dificuldade de mastigação e podem deixar de lado uma série de alimentos importantes, causando emagrecimento. Além disso, doenças do trato gastro-intestinal podem alterar o processo de absorção dos nutrientes e também causam perda de peso”, explica a chefe do Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Fernanda Busnello.

Para a nutricionista é importante investigar o quadro geral de saúde do idoso e adequar a sua alimentação. Maia acusa a falta de informação como causa predominante da subnutrição em idosos, além da dependência de outras pessoas para o preparo e administração dos alimentos e imposições dietéticas rígidas. “Ser obrigado a ingerir alimentos dos quais não gosta, mas que um filho julga importante, não é raro”, conta.
1 – Descompensação
Incapacidade do organismo em restabelecer o equilíbrio físico alterado por um problema estrutural ou funcional. Ocorrem vários tipos de descompensação: de ordem cardíaca, hormonal e também é muito frequente em idosos, sobretudo naqueles que sofreram acidentes cardíacos e vasculares.

Cereais, frutas, água e vida
Alzirina mantém a forma com sessões de ginástica e boa alimentação

Doenças psiquiátricas, como a depressão, e neurológicas, como Alzheimer, podem causar perda de peso. “Também alguns medicamentos, principalmente a digoxina, droga usada no tratamento de algumas doenças cardíacas, podem reduzir o apetite e provocar má nutrição”, acrescenta Fernanda. Ela explica que quanto mais bem nutrido o idoso estiver, melhor a imunidade para enfrentar mudanças de temperatura ou qualquer outro tipo de instabilidade. “O idoso mais nutrido também tem menor risco de infecção quando em internação hospitalar”, afirma.

Maia concorda e completa: “A alimentação regular e balanceada contribui para a manutenção da saúde e do bem-estar do idoso. Além do melhor controle de doenças com graves consequências, como a diabetes, o colesterol alto ou a obesidade”. A nutricionista recomenda aos idosos uma dieta com ao menos três refeições principais ao dia, também dois lanches intermediários, um pela manhã e outro no período da tarde. “A ingestão de cereais, de preferência grãos integrais, para facilitar o trânsito intestinal, de verduras e frutas, que são fontes de vitaminas, fibras e sais minerais e o consumo frequente de água são indispensáveis”, conta. Também leite e derivados, fontes de cálcio, devem estar presentes na dieta por serem importantes na prevenção da osteoporose.

Caminhadas
Edson Borges, 78 anos, é casado e tem dois filhos e dois netos. O servidor aposentado é diabético e segue as recomendações de seu médico à risca. “Faço três refeições ao dia. No café da manhã tomo café com leite e como pão e frutas, depois almoço como um brasileiro tradicional — salada, arroz, feijão e carne —, tudo preparado pela minha esposa; na janta tem sopa de legumes”, conta. “Também faço um lanche no meio da tarde, com chá e frutas, e antes de dormir como mingau de aveia”, completa.

Além disso, Borges faz caminhadas diárias no Parque da Cidade: “Exceto aos domingo, que é dia de descanso”, diz. Preocupada com a saúde e o bem-estar, a dona de casa Alzirina Soares Santos, 73, também faz três refeições ao dia. “Café preto, frutas e pão integral no café da manhã, depois sigo para academia, onde faço musculação, caminhada na esteira e alongamento. Depois disso, tomo um copo grande de suco de laranja”, conta.

O almoço é tradicional, mas com frutas de sobremesa. A avó de seis netos admite que deveria fazer um lanche intermediário, mas depois só se alimenta no jantar, com uma sopa de legumes, e toma um iogurte antes de dormir. Pessoas como Alzirina e Edson não sabem o que significa disfagia (1), porque se alimentam bem e mantêm suas fontes de energia em dia.

1 – Disfagia
Dificuldade de deglutição. Pode ter causas otorrinolaringológicas, digestivas ou neurológicas. Pode ser tratada com fonoaudiologia e medicação. Normalmente ocorre disfagia em pacientes que sofreram acidentes vasculares cerebrais ou outros transtornos neurológicos. A disfagia também é muito frequente em pessoas idosas

(Fonte: Carolina Khodr – Especial para o Correio Braziliense)