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Como é do conhecimento de todos, a Eletrobras foi privatizada em junho de 2022 durante o Governo Bolsonaro, apesar de todas as denúncias de irregularidades apresentadas pelo Coletivo Nacional dos Eletricitários – CNE, pelo Ministro do TCU, Vital do Rêgo, por diversos parlamentares e por especialistas e associações do Setor Elétrico.

É importante ressaltar que os defensores da privatização usaram três argumentos para a desestatização da empresa: a) melhoria de gestão; b) redução da tarifa e melhoria dos serviços de energia elétrica; e c) aumento dos investimentos.

Passados quase dois anos após a privatização, a constatação é que a gestão da companhia piorou e muito, gerando um clima organizacional na empresa de terror em razão da prática cada vez maior de assédio moral, ameaças de demissões num cenário já concretizado mais de 4.000 empregados demitidos sem justa causa, retirada de direitos, redução salarial e uma, terceirização infinita e irresponsável provocando lamentavelmente uma quantidade de óbitos nunca vista antes na história da empresa.

O argumento utilizado para os trabalhadores é que se trata de uma adequação ao mercado. Já para os administradores da Eletrobras, conforme consta do balanço da empresa, foi dado um aumento salarial estratosférico e surreal, completamente fora do mercado e da realidade nacional e até internacional, chegando um Vice-presidente, por exemplo, a receber, em média, R$ 670.000,00 (SEISCENTOS E SETENTA MIL REAIS) por mês.

Além disso, a tarifa aumentou e a qualidade dos serviços piorou muito, ocorrendo “apagões” de proporções nacional e em várias regiões do País. Não obstante ter servido como desculpa para a privatização da Eletrobras, bem como com  a imensurável venda de ativos realizada a toque de caixa e a preço de banana, SEM QUALQUER PARTICIPAÇÃO, AQUIESCENCIA OU CIÊNCIA DA UNIÃO, detentora de 43% das ações da empresa, os investimentos até o presente momento são pífios, atingindo apenas R$ 6,51 bilhões, somente 20% do necessário para que a Eletrobras mantenha a capacidade de geração e transmissão da época em que era uma empresa estatal, o que coloca em risco a segurança energética do país.

O CNE luta incessantemente pela retomada da Eletrobras pelo povo brasileiro e por isto mesmo os dirigentes sindicais, juntamente com a categoria eletricitária, se empenharam na eleição do presidente Lula, que representava um projeto político de reconstrução do Brasil que passava necessariamente pela reestatização da Eletrobras.

Durante a campanha eleitoral, o então candidato Lula se comprometeu com a reestatização da Eletrobras e mesmo após a sua eleição, em diversos momentos, deu declarações duras à imprensa classificando a privatização da Eletrobras como um “escárnio, errática, quase uma bandidagem e crime de lesa-pátria”. Determinou que a Advocacia-Geral da União – AGU entrasse no STF com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI para a recuperação do poder de voto da União, proporcional a sua participação acionária na empresa.

Reconhecemos que em diversos momentos, o CNE, legítimo representante dos trabalhadores eletricitários, foi muito bem recebido por diversos órgãos do governo e parlamentares, mas, infelizmente, até o momento não conseguimos nada de concreto, além de boas intenções.

O MME vem deixando de cumprir o seu principal papel institucional, que é zelar pelo fornecimento adequado de energia elétrica, exigindo dos agentes responsáveis pela concessão dos serviços públicos de energia elétrica o respeito aos contratos, bem como evitar “apagões” de grandes proporções no país, como o que ocorreu em 15 de agosto de 2023. E não foi por falta de avisos do CNE.

Consideramos que a AGU deveria receber com frequência as representações de trabalhadores para ter acesso a materiais, denúncias, avaliações de especialistas, ao invés de ir “às cegas” para a mesa de negociação com os representantes da Faria Lima e do capital estrangeiro que mandam no dia a dia da Eletrobras. A quem interessa esta fragilidade na correlação de forças e esta falta de preparo prévio da AGU na discussão de cenários e na avaliação dos atos lesivos ao erário antes de se sentar à mesa com aqueles que comandam a Eletrobras?

A AGU e a PGFN ficaram caladas na assembleia geral de acionistas que decretou a incorporação de Furnas pela holding. Infelizmente a AGU, além de ter se omitido juridicamente em questões relevantes referentes a Eletrobras, deixando de cumprir o seu papel institucional, em diversos momentos se aliou à empresa contra os trabalhadores, o que é inaceitável. Além de ter deixado de entrar com ações judiciais para impedir a deterioração da Eletrobras, prejudicou ações judiciais impetradas pelo CNE contra o desmonte da empresa, pois algumas liminares foram “derrubadas” pelo Poder Judiciário sob a alegação de que o principal interessado, a União, não havia se manifestado nos autos do processo.

Para piorar ainda mais, é inadmissível do ponto de vista ético e moral que tenhamos membros da AGU que contribuíram para a privatização da empresa no governo Bolsonaro e depois se aproveitaram de tal ato em benefício próprio, a ponto de largarem a própria AGU e sem um período quarentena ingressaram na diretoria da Eletrobras. ‘Pior ainda, temos um membro atual da AGU que continua licenciado há anos no referido órgão e exerce cargo de direção na Eletrobras. Onde fica o interesse público?

Outro exemplo mais recente de que a AGU se encontra em estado letárgico, reside em permanecer calada na indicação pela União de um candidato ao Conselho de Administração, em Assembleia Geral Ordinária que acontece no dia 26 de abril de 2024. O edital permitia que qualquer acionista com ações superiores a 0,5% do capital social votante indicasse candidatos e a União “cochilou” e deixou de exercer essa premissa na disputa pela vaga. Se estivesse realmente atuante poderia ter um assento no Conselho a partir de maio 2024, independente da arbitragem. O distanciamento da AGU dos trabalhadores impacta a velocidade, a capacidade e a qualidade de resposta da Advocacia-Geral da União.

Além da ADI 7385, em maio de 2023, a AGU não fez mais absolutamente nada e foi completamente omissa no sentido de evitar a deterioração do patrimônio público, em relação aos desmandos praticados pela Eletrobras, apesar deste ser o seu principal papel.

O CNE solicitou insistentemente agendas com o Presidente Lula, para tratar de questões referentes à Eletrobras e que impactam o desenvolvimento do país, por meio de ofícios e também através de ministros do governo e parlamentares, mas até o presente momento, infelizmente, o presidente não recebeu o CNE, representante dos eletricitários e seu aliado de sempre, nos bons e maus momentos. Apesar de não ter recebido o CNE, recebeu diversas outras categorias e até segmentos conservadores que o combatem diariamente. A categoria se sente completamente desprestigiada, relegada ao segundo plano pelo presidente que ajudou a eleger. Fomos às ruas contra o golpe que a presidente Dilma sofreu, participamos de passeatas na campanha “Lula Livre”, enfrentamos diariamente Bolsonaro, Paulo Guedes e sua trupe, enfrentamos os almirantes que mandavam e desmandavam no MME, Itaipu e no dia a dia das empresas Eletrobrás e participamos ativamente da batalha campal que foi as eleições de 2022. Não fomos telespectadores do destino do país: fomos protagonistas, integrantes do pelotão de frente, desbravando todas as adversidades.

Fruto de uma decisão do Ministro do STF, Nunes Marques, está ocorrendo, na Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal – CCAF, uma tentativa de solução consensual para o impasse entre a União e a Eletrobras. Objetivando aproveitar este momento, o CNE solicitou que a União levasse à mesa de conciliação questões referentes a Eletrobras de fundamental interesse para os trabalhadores e para o país como o risco de colapso no sistema elétrico brasileiro, devido aos desligamentos em massa, que estão ocorrendo na empresa, sem preservação da memória técnica, entre outros pontos. Infelizmente, até o presente momento, também não fomos atendidos.

Por último, queremos lamentar profundamente, a publicação no Diário Oficial de 10/04/2024 da Medida Provisória, que objetiva a antecipação de R$ 26 bilhões da Conta de Desenvolvimento Energético – CDE, para reduzir o valor da conta de luz e prorrogar subsídios para fontes renováveis de energia, sem que esta Medida Provisória tenha sido objeto de nenhum debate. Além disto, é importante destacar que ao fazer uso desses recursos o Governo Lula está referendando politicamente a privatização da Eletrobras, processo eivado de vícios e irregularidades e considerada, pelo próprio presidente Lula, um crime de lesa-pátria.

Infelizmente a frustração da categoria eletricitária é muito grande. É necessário que o Governo Lula faça uma reflexão e uma correção de rumo, em relação à Eletrobras e que não abandone os eletricitários, seus aliados de sempre, à própria sorte. Não porque pensamos ser uma categoria diferenciada, mas principalmente porque muito do que o Governo busca para o futuro, enquanto industrialização, transição energética, só terá sucesso se a Eletrobras for estatal e com o conhecimento técnico que estes trabalhadores (as) eletricitários(as) carregam.

Temos como contribuir com os debates para a reforma institucional do setor, mas, para isso, temos que ser convidados para compor a mesa com outros grupos que representam diversos interesses. Afinal o Governo deveria ouvir os especialistas ligados às entidades sindicais e não apenas os representantes dos “patrões”. Fica a dica para que a Casa Civil traga especialistas das entidades sindicais, complementando a mesa que se reuniu no dia 10 de abril.

É fundamental que o Governo Lula, na mesa de conciliação com a Eletrobras, não aceite proposta que prejudique os trabalhadores do setor elétrico e a segurança energética do País.

Ainda acreditamos que o “nosso Governo” não será conivente com as demissões em massa, com a retirada de direitos históricos, com a redução de salários e com a precarização da saúde e da previdência complementar dos eletricitários, bem como com o risco de colapso do setor elétrico brasileiro.

Seguimos firmes na luta. Defendemos o Governo Lula em múltiplas arenas, mas esperamos que os ministros estejam abertos e orientados a ouvir os sindicatos na construção da pauta política, econômica, energética e social do nosso país. Somos companheiros de todas as horas e companheirismo não pode jamais ser uma via de mão única.