O relatório “América Latina e Caribe: Perspectivas para o Meio Ambiente”, divulgado na semana passada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), classifica o Brasil como o líder mundial em reciclagem. Dados domésticos, entretanto, revelam que setor está estagnado no país.

De acordo com o relatório, a indústria da reciclagem brasileira emprega 170 mil pessoas e coloca o Brasil, juntamente com o Uruguai e o Caribe, entre os países de maior destaque no segmento.

O Brasil também é lembrado por esforços para conter o desmatamento e pelo investimento público em meio ambiente equivalente a 0,06% do Produto Interno Bruto (PIB).

O Uruguai recebeu a menção por utilizar fontes alternativas de combustível e o Caribe por implementar práticas de eficiência energética no setor do turismo.

Veja na íntegra o relatório “América Latina e Caribe: Perspectivas para o Meio Ambiente” do Pnuma (em inglês).

O documento do Pnuma também indica soluções e políticas públicas que podem ser realizadas até 2012, quando acontecerá o Rio 20, reunião internacional pelo meio ambiente, no Rio de Janeiro.

O relatório aponta para os desafios ambientais enfrentados pela América Latina e pelo Caribe e indica que governos e sociedade civil devem trabalhar juntos para elaborar políticas públicas e instituições para combater a crescente degradação ambiental na região.

Apesar do status de campeão mundial da reciclagem, a realidade brasileira mostra outra situação. Dados do Panorama de Resíduos Sólidos de 2009, estudo elaborado pela Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), indicam que o setor praticamente estacionou em 2009 em comparação ao ano anterior, enquanto que a geração de resíduos sólidos no mesmo período aumentou em 7,7%.

“O Brasil continua tendo políticas voltadas para a gestão dos resíduos que simplesmente resolvem o problema na destinação final, enquanto a coleta seletiva continua sendo implementada por inciativas pontuais de empresas ou entidades e ações informais,” disse Carlos Roberto Vieira, diretor executivo da Abrelpe. “O resultado disso é que o setor de reciclagem também não avançou muito entre 2008 e 2009.”

De acordo com o estudo, o número de municípios brasileiros que fazem coleta seletiva aumentou apenas 0,7%, chegando a 55,9% dos 5.565 municípios no país. O índice de reciclagem de plásticos, vidro, papel e alumínio ficaram estacionados nos mesmo índices de 2008: 19%, 47%, 45% e 50% respectivamente.

O estudo também aponta que a geração de resíduos chegou a 57 milhões de toneladas em 2009, o que representa um aumento de 7,7% do volume gerado em 2008, enquanto o volume coletado aumentou 8%, chegando em 50 milhões de toneladas no ano.

A análise por regiões dos programas de reciclagem mostram que no Sudeste 78,7% dos municípios tiveram programas de coleta seletiva em 2009, no Sul, 76%, no Norte, 44,1%, no Nordeste, 34,2% e no Centro-Oeste, 26%. Em 2008, estes índices eram, respectivamente, de 78,4%, 75,7%, 42,8%, 33,7% e 22,7%, ou seja, o segmento manteve-se praticamente estacionado no ano passado.

Segundo a associação, o grande salto na gestão do lixo acontecerá com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, aprovada recentemente pelo Senado, após 21 anos de tramitação e que forçará o setor público a planejar a gestão de resíduos e o setor produtivo a pensar na reciclagem e a elaboração de contratos para reduzir a quantidade de resíduos que vão para aterros.

“A aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos se torna fundamental para mudar a realidade do País, que ainda conta com a disposição inadequada de 22 milhões de toneladas e com 7 milhões de toneladas de lixo que sequer são coletadas”, afirma Vieira.

A tramitação do projeto de lei que cria a política de resíduos brasileira foi truncado por interesses industriais, segundo posicionamento do Movimento Nacional dos Catadores de Recicláveis.

“O andamento da Política Nacional de Resíduos Sólidos sempre foi bloqueado pelo interesse da indústria que prefere não se responsabilizar pelos resíduos de gera”, afirmou a entidade em nota.

Apesar de reconhecer que a legislação contempla a inclusão do trabalho dos catadores de materiais recicláveis no sistema de gestão de resíduos, o movimento repudia o favorecimento da implantação de incineradores para geração de energia a partir do lixo, iniciativa aprovada na última discussão dos senadores sobre a questão e que consta no texto que aguarda a sanção presidencial.

“Nossa opinião é que a mudança desvirtua o projeto e vai na contramão dos próprios princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos”, diz a nota.

Segundo a associação dos catadores as usinas de incineração geram furanos e dioxinas, substâncias prejudiciais à saúde e que, em alguns casos, estão relacionadas com o aparecimento de câncer em trabalhadores, além de ameaçar a reciclagem de materiais a o trabalho dos catadores, já que ela necessita de plástico, papel e materiais que causem combustão para gerar calor suficiente para gerar energia.

“Outro princípio é o da ecoeficiência, incompatível com o custo-benefício da adoção de incineradores comparada ao investimento na coleta seletiva e na criação de cooperativas de catadores que é, provadamente, um dos menores investimentos na geração de trabalho do mercado”, conclui a nota.

A associação dos catadores liderou um movimento em dezembro de 2009, juntamente com mais 11 entidades, posicionando-se contra a geração de eletricidade a partir da queima do lixo de vido à atividade ser um processo poluidor e que pode reduzir a quantidade de material destinado à reciclagem.

Apesar das manifestações contrárias, a questão foi incluída na legislação que deve ser sancionada pelo presidente até 3 de agosto e já está sendo negociada em algumas cidades do país, entre elas em Goiás, Rio de Janeiro, Paraná e Minas Gerais.

(Fonte: Fernanda Dalla Costa, Revista Sustentabilidade)