Cartões oferecidos por grandes varejistas, como supermercados e lojas de departamento, cobram juros de 122% a 492% ao ano. A taxa exorbitante, ao lado da exigência de multas e outros encargos para quem atrasa a parcela ou opta por pagar apenas o valor mínimo da fatura, faz da ida às compras um convite ao endividamento. Na hora de fisgar os clientes, os vendedores enumeram as vantagens, como o desconto em produtos ou nas contas quitadas em dia e isenção de anuidade. As desvantagens são anunciadas com mais discrição ou deixadas de lado. Muitas vezes, quem paga o boleto não sabe nem sequer o que está embutido.

Especialistas denunciam que as tarifas dos cartões de crédito de bandeira própria (de lojas ou marcas varejistas) superam os valores das instituições bancárias. Um levantamento da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) mostra que, em abril, a taxa média mantida pelos bancos foi de 238,30% ao ano. Ao mês, o índice é de 10,69%. Enquanto isso, grandes marcas cobram de 6,9% a 15,99%, fora taxas.

Rogério Olegário, especialista em finanças pessoais, aconselha os consumidores a tomarem medidas radicais, como ter apenas um cartão para uso. “Corte todos os demais e jogue fora. Se for comprar um produto de alto valor, veja se é possível pagar à vista, espere e junte a quantia. Nunca parcele nada. Moramos num país campeão de juros e o prejuízo é só do consumidor”, explica.

Comprometimento
O brasileiro compromete, em média, 30% da renda com despesas financeiras. Assim, uma família com renda mensal de um salário mínimo, R$ 545, gasta R$ 163,50 para pagar juros e encargos. “É dinheiro jogado fora. O mesmo valor aplicado durante 10 anos na poupança renderia mais de R$ 27 mil”, diz Olegário.

Na hora de avaliar se há necessidade de fazer um novo gasto, vale a pena responder as seguintes perguntas: “Eu preciso? Tenho dinheiro suficiente? Tem que ser hoje?” Caso todas as respostas sejam afirmativas, o especialista garante que não haverá transtornos futuros. Com um método diferente, a empregada doméstica Valdinete Trindade Santos, 33 anos, diz que consegue administrar os cinco cartões que a acompanham todos os dias, dentro da carteira. “Eu tenho tudo anotado em uma agenda, não perco prazos, nunca pago juros e não gasto mais do que posso”, conta.

Apesar de ser organizada, ela cogita ficar com apenas um cartão. “O problema é que volta e meia eu vou ao shopping e me dá muita vontade de comprar, coisa de mulher. Normalmente, vou até a loja para pagar a conta e volto para casa com um short novo”, brinca. A única crítica que ela faz é quanto às informações repassadas pelos atendentes. “Dizem que determinado número de parcelas não tem juros, mas quando você vai ver está lá. Ou garantem que não vai ter anuidade, mas depois ela aparece.”

Após enfrentar o mesmo problema, o técnico em agropecuária Wesley Barros Botelho, 51 anos, optou por reduzir aos poucos a quantidade de cartões. “Quando decido pagar o valor mínimo, recebo uma carta com tantas taxas que nem dá para saber ao certo o que eu estou pagando. Por isso, toda vez que um cartão parece-me inviável, cancelo e guardo no baú”, diz. Para ele, um outro problema é quando a loja exige o pagamento presencial. “É complicado, não tem como deixar o trabalho para ir ao shopping apenas pagar uma conta”, reclama.

As condições
O Correio Braziliense entrou em contato com oito grandes empresas de varejo para checar as condições disponíveis para pagamento dos cartões. De todas as consultadas, apenas a C&A, o Wall Mart, o Grupo Pão de Açucar e o Extra optaram por não divulgar
as informações.

» Renner
Juros cobrados ao mês: 6,99%
Juros cobrados ao ano: 122,71%, mais IOF
Encargos por atraso: de 14,99% ao mês ou 434,47% ao ano
Taxa de adesão: Não é cobrada
Multa contratual: 2% ao mês, IOF, mora de 1% ao mês e R$ 1,90 para ressarcimento de despesas com terceiros

» Riachuelo
Juros ao mês: 6,90%
Juros ao ano: 122,7% ao ano
Encargos por atraso: 13,5% ao mês
Taxa de adesão: Não há taxa de adesão.
Multa contratual: 2% ao mês mais mora de 1% ao mês

» Carrefour
Juros ao mês: de 2,99% a 15,99%
Juros ao ano: de 42,41% a 492,99%
Encargos por atraso: multa contratual de 2% e correção monetária de 1% ao mês
Taxa de adesão: Não há taxa de adesão
Multa contratual: 2% ao mês.

» Otoch
Juros cobrados ao mês: 6,99%
Juros cobrados ao ano: 124,97%
Encargos por atraso: 17,29%
Taxa de adesão: Não é cobrada
Multa contratual: 2% ao mês

» Marisa
Anuidade: R$ 1,95 (Cartão Marisa)
Anuidade: R$ 3,90 (Cartão Marisa Itaucard) Juros para compra parcelada: 6,9% ao mês (a partir de 6 vezes)
Juros rotativos: 14,9% ao mês
Multa: 2%
Juros de mora: 1% ao mês

(Júlia Borba, Correio Braziliense, 23.05.11)