(*) Rafael Cortez e (**) Felipe Salto

São duas as grandes questões envolvendo o salário mínimo e que deveriam merecer atenção especial dos tomadores de decisão. A primeira questão é de ordem fiscal, e a segunda, de ordem normativa e diz respeito aos mecanismos mais eficientes para a política redistributiva.

Uma política de ganhos reais para o salário mínimo reflete escolhas entre os beneficiários da ação do governo, seja no tempo presente, seja no tempo futuro.

Se a atual política de ganhos reais elevados continuar, a despesa com benefícios previdenciários será conduzida, em 10 anos, a quase 10% do Produto Interno Bruto (ante os atuais 7% do PIB), dada a indexação de uma miríade de programas e benefícios sociais ao salário mínimo.

Deste modo, a política de expansão do salário mínimo gera gastos públicos automáticos de quase R$ 300 milhões para cada R$ 1 de aumento no mínimo.

O seguro-desemprego, a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas) e a Previdência Social estão atrelados ao salário mínimo, o que explica a pressão fiscal originada nos reajustes do salário mínimo – isto para nos atermos apenas ao campo federal.

Desta forma, o salário mínimo é um canal para redistribuição de renda, não apenas entre os trabalhadores, mas tem sido peça central para o Estado de bem-estar social brasileiro. Assim, a regulação do salário mínimo afeta não apenas o mercado de trabalho, mas as contas do governo.

A chamada “regra do PAC” deve gerar gastos extras de cerca de R$ 25 bilhões em 2012. Uma possível política alternativa para o mínimo seria associar o reajuste à evolução da produtividade.

Como defender, contudo, que o salário mínimo precisa ser contido, em momentos como o atual, evitando pressões fiscais, se os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário acabam de elevar seus próprios recebimentos? Claro que estes aumentos e reajustes autoconcedidos têm impacto fiscal significativamente menor, mas eles dificultam a defesa política da redução de gastos.

Para tornar legítima esta nova proposta de reajuste do mínimo, seria preciso que o exemplo partisse de cima, do “corte na própria carne”.

(*) Doutor em ciência política pela USP, professor da PUC-SP e analista da Tendências Consultoria
(**) Economista pela FGV-EESP, mestrando em administração pública e governo pela FGV-Eaesp e analista da Tendências Consultoria

(Folha de S.Paulo, 12.02.11)