Tudo começou quando o arquiteto Maurício Vargas teve um problema com a TAM em 1999 e perdeu um voo de negócios. Inconformado, ele criou o primeiro site de reclamações da América Latina, lançado em 2001. O Reclame Aqui ficou famoso entre os internautas e recebe hoje uma média de 180 mil visitantes e 7 mil queixas por dia. O recurso ganhou a rede e inúmeros outros sites foram criados com o mesmo objetivo: divulgar entraves entre clientes que se sentiram lesados e empresas prestadoras de serviços. Hoje, a função das páginas extrapola o objetivo da criação. Elas passaram a servir também como fonte para pesquisas. É uma forma de os potenciais compradores assegurarem que futuros investimentos serão acertados ou, ao menos, que a empresa será rápida para resolver eventuais problemas.

A maioria desses sites não cobra pelo serviço, mas também não se responsabiliza pelo que o usuário publica e não garante solução. Mesmo assim, Maurício Vargas assegura que 74% dos usuários insatisfeitos são atendidos, após publicarem os desabafos no Reclame Aqui. “Em número de reclamações, recebemos 20 vezes mais que o Procon. Temos mais de 4 milhões de pessoas cadastradas e hoje dominamos 90% desse mercado. A vantagem que eu vejo é a falta de burocracia. Você preenche o cadastro e pronto”, explica.

O publicitário David Murad conta que testou um site de reclamações, pela primeira vez, há uma semana. “Eu comprei um filtro para encaixar na torneira, só que não serviu na minha pia. Só depois encontrei na embalagem, em letras miúdas, que o tamanho era muito específico. Vi outras reclamações na internet e publiquei a minha também. A fabricante me contatou em seguida e já recebi meu dinheiro de volta”, comemora.

Segundo o presidente do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (Idecon), Reginaldo Araújo Sena, ter espaços para reclamação on-line é extremamente positivo para divulgar os episódios. “As entidades públicas têm poder de multar e as demais usam a comunicação. Muitas vezes, essas notas na internet causam impacto maior do que uma decisão judicial, porque outras pessoas são influenciadas. E as empresas estão de olho nesses sites. Quando a marca está exposta, há interesse em resolver”.

O publicitário Edson Sousa Júnior, dono de um blog voltado para o consumo em Brasília, diz que adquiriu o hábito de pesquisar na rede antes de escolher uma marca ou produto. “Os sites têm até um ranking das principais reclamações e das empresas que respondem mais rápido. E eu sigo essas referências antes de comprar”. Ele também conta que ao criar um espaço para comentar sobre novidades e serviços em Brasília, acabou recebendo diversas críticas de leitores que ficaram insatisfeitos com a experiência em alguns lugares da cidade. “Por isso, eu vou dedicar um espaço só para essas reclamações na minha página, assim outras pessoas podem aprender com essas experiências.”

Cuidados
O presidente do Idecon, Reginaldo Sena, ressalta que os usuários devem estar atentos para não tornarem o problema ainda maior. Segundo ele, empresas que se sentiram lesadas pelos comentários publicados já começaram a processar donos de postagens que seriam enganosas ou difamatórias. “Eu sei de casos em que os clientes tiveram de indenizar a empresa. Agora, isso acontece quando a pessoa não tem provas. Seria muito fácil difamar se não houvesse nenhum risco para quem publicou. Mas, basicamente, se o consumidor estiver agindo de forma séria, sem tirar proveito, ele será bem-vindo e não terá problemas”, garante.

O diretor-geral do Procon, Oswaldo Morais, desconhece o funcionamento das páginas de reclamação na internet e também desconfia do serviço. “É até perigoso. Quem está tutelando a página? E se alguém errar, como vai assumir o erro?”, questiona. Por esse motivo, cabe também ao usuário procurar o expediente do site e confirmar se a página é confiável ou se as regras são condizentes.

Financiamento
Para manter o serviço funcionando, as empresas de reclamação on-line captam recursos de diversas formas. No entanto, nem todas expõem visivelmente essas opções. Alguns sites pedem doações aos usuários, que podem contribuir pela própria rede, por meio de transferências. Outras, aprovam anunciantes em lugares específicos da página. Há ainda as que usam o nome da própria marca como atrativo para produzir eventos e consultorias voltados para empresas. Nesses casos, especialistas ensinam aos funcionários a forma mais eficiente de evitar problemas com clientes, além da maneira mais direta de atendê-los.

Para filtrar informações negativas sobre uma marca, algumas empresas também elaboraram um produto que monitora as redes sociais. O serviço é vendido para as empresas como um método eficiente de alcançar todos os insatisfeitos que estiverem navegando pela web. Na maioria dos casos, o contato e as negociações começam a ser feitos ainda pela internet.

(Júlia Borba, Correio Braziliense)