A pesar das diversas políticas públicas defendidas e criadas pelos órgão do governo, o atendimento às gestantes brasileiras na rede pública ainda deixa muito a desejar. Relatos de falta de respeito às mulheres na hora do parto — um dos momentos de maior estresse, desconforto e medo — não são raros e a atenção às mães após o nascimento está longe de ocorrer como deveria. Pesquisas da Universidade de São Paulo (USP) e de Brasília (UnB) apontam algumas dessas falhas recorrentes que podem contribuir para a mortalidade materna e para o agravamento de quadros de depressão pós-parto. Soluções para esses problemas existem; escasso é o número de profissionais especializados nas redes de atendimento, além da fiscalização efetiva para que as orientações sejam cumpridas.

Os problemas começam logo no pré-Natal. Grávida de cinco meses, a auxiliar de escritório Jeni Barreto, 19 anos, teria sua quarta consulta, mas pela quarta vez o encontro teve de ser remarcado por falta de profissionais disponíveis para o atendimento. “Quase toda vez é assim, e quando consigo a consulta são três horas de espera e 10 minutos de atendimento”, reclama a jovem. Jeni, que mora em São Sebastião, diz também que não se sente confortável com a rotatividade de profissionais que a examinam. “Acho que, se fossem as mesmas pessoas, o acompanhamento seria melhor.” Já com o bebê no colo, Almery Silva, 34 anos, conta que conseguiu fazer todo o seu pré-Natal. “Algumas consultas tiveram que ser remarcadas, mas acompanhei bem minha gravidez”, diz.

Diretor do Departamento de Ações Programáticas e Estratégicas do Ministério da Saúde, José Luiz Telles reconhece a falta de profissionais, principalmente na Região Norte e em áreas mais isoladas. “Lidar com a grande rotatividade de profissionais de saúde é um desafio para o Sistema Único de Saúde. Temos que construir uma plano de carreira para que as equipes médicas não mudem com tanta frequência”, diz.

Segundo Telles, mais de 80% das gestantes brasileiras passam por pelo menos seis consultas de pré-Natal — número mínimo recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Ele explica também que são apresentadas aos profissionais as diretrizes sobre parto humanizado e condutas de atendimento às pacientes, mas que não cabe ao ministério fiscalizar se os estados e municípios estão seguindo essas instruções.

De acordo com a doutora em saúde coletiva pela USP Janaína Aguiar, a realidade das maternidades onde o parto humanizado não é implementado é desastrosa. “No serviço público, a demanda é muito grande, existe a dificuldade estrutural e de recursos humanos. Mas isso não justifica a violência a que muitas mulheres são submetidas”, diz.

Segundo o estudo da pesquisadora, tratamento grosseiro, maus-tratos, desrespeito e humilhação são comuns em algumas maternidades públicas da capital paulista. “Ocorre ameaça de abandono e há relatos de que as mulheres são privadas do choro: um reflexo da cultura de que a dor do parto é o preço pago pelo prazer sexual. Elas são forçadas a calar sua dor.”

Mais de vinte mulheres com bebês de até três meses de idade e que foram atendidas em maternidades públicas do estado de São Paulo foram entrevistadas para compor a pesquisa. Uma das reclamações mais sérias constatadas foi a privação da presença do acompanhante durante o trabalho de parto — direito assegurado por lei. “As maternidades alegam que não têm estrutura para receber o acompanhante”, diz a pesquisadora.

O medo da depressão

Segundo a psicóloga do Hospital Universitário de Brasília e professora da Faculdade de Medicina da UnB Rosana Tristão, cerca de 40% das mulheres sentem uma leve depressão após o nascimento do bebê. A grande quantidade de mudanças na vida da mulher e de alterações hormonais pode desencadear os sintomas, que surgem nos 10 primeiros dias após o parto e regridem até o fim do primeiro mês.

Presidente da Comissão Nacional Especializada em Assistência Pré-Natal da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, Geraldo Duarte defende que o apoio do parceiro e da família durante a gestação e após o parto são fundamentais para prevenir a depressão pós-parto. “A mãe não pode ficar isolada, e quanto mais informações sobre a gravidez, o parto e cuidados do bebê ela tiver, menores as chances de desenvolver a depressão pós-parto”, diz. “Quando a mulher tem todo esse respaldo, no caso de uma possível depressão pós-parto, os sintomas são mais brandos e menos duradouros”, explica.

(Correio Braziliense)